Ronaldo Entler | 8.out.2012
Esta 30ª edição da Bienal de São Paulo parece ter feito as pazes com o olhar. O espaço dedicado aos artistas é generoso: de cada um deles, o que encontramos não é apenas uma amostra, mas um percurso. Isso nos dá o tempo mínimo para dialogar com suas produções. As informações estão disponíveis, enriquecem esse diálogo, mas não estão lá para compensar com retórica o fracasso da produção de sentido. Há muito o que debater, mas há também muito o que ver em silêncio. Alguns espaços vão além, e colocam em
Leia Mais Ronaldo Entler | 24.set.2012
Viagens no tempo aparecem de forma recorrente na obra do fotógrafo e cineasta Chris Marker, a exemplo do que vemos em seus trabalhos mais conhecidos, o “foto-romance” La Jetée (1962) e, mais sutilmente, em Sans Soleil (1983). Viajar no tempo é algo que ele mesmo faz na relação que estabelece com seus arquivos. Desde seus primeiros trabalhos, ele assume transitar por um terreno instável: os sentidos das imagens. E faz delas o palco em que a história contracena com o presente. Dessas experiências, podemos tirar algumas lições: 1. as imagens
Leia Mais Cláudia Linhares Sanz | 20.ago.2012
As casa antigas sempre me intrigaram. Morei dez anos num sobrado cujas portas e janelas, de madeira, não fechavam direito de tão antigas. O teto, também de madeira, ‘ecoava’ tudo que acontecia no andar de cima. De anos em anos, as paredes sujas – as marcas dos pés debaixo da escrivaninha, a disposição dos quadros, o arranhado das costas das cadeiras, o decalque da bola atirada contra a parede, o queimado do sol à direita de meu quarto – eram vestígios substituídos pela pintura branca. A cada sucessiva pintura refaziam-se
Leia Mais Ronaldo Entler | 30.jul.2012
O acesso às pinturas rupestres é hoje bastante restrito. Muitas delas foram depredadas por curiosos, turistas e até mesmo por cientistas. Além disso, a luz artificial e a umidade deixada pela respiração do público favorecem o surgimento de um tipo de mofo que ameaça as pinturas. Werner Herzog conseguiu uma autorização para filmar a Caverna de Chauvet durante seis dias, e lá realizou o documentário A caverna dos sonhos esquecidos, lançado em 2010. Nesse trabalho, ele aderiu à tecnologia 3D, interessante não apenas pelo realismo, mas também pelos defeitos que assume: objetos
Leia Mais Mauricio Lissovsky | 4.jun.2012
De onde vêm estas cenas de Luis Gonzalez Palma? Da memória – é fácil responder. O próprio artista nos diz em um texto de apresentação de seu trabalho: “memórias imaginadas”. Mas que diferença há entre “memórias imaginadas” e nossas recordações vulgares? Mesmo aquelas que a distância no tempo esmaeceu? Walter Benjamin escreveu uma vez que, na hora da morte, isso que passa pela cabeça dos homens são como as figurinhas que colecionava quando criança – figurinhas que envolviam um feixe de balas em forma de palitos. Isto é, são imagens
Leia Mais Ronaldo Entler | 21.maio.2012
Neste último sábado, estive no I Encontro Pensamento e Reflexão na Fotografia, no MIS, conversando sobre a experiência do Icônica com os amigos Fernando de Tacca, da Revista Studium, e Mane Adaro, do blog Chilenización de la Fotografia. A proposta era pensar a internet como espaço de difusão do pensamento sobre a fotografia. O Icônica nasceu da vontade de compartilhar de um modo mais informal nossas pesquisas e intuições, e da constatação de que a internet é um grande espaço para fazer circular o pensamento. O blog é, de fato,
Leia Mais Ronaldo Entler | 7.maio.2012
Morreu na semana passada, aos 66 anos de idade, o artista suíço David Weiss que, desde o final dos anos de 70, trabalhava em parceria com Peter Fischli. A dupla Fischli & Weiss se consagrou com várias séries fotográficas que foram, no entanto, pouco reconhecidas pelos críticos de fotografia. Entendidas como registros de esculturas e instalações, suas fotos pareciam manter certa subserviência diante de técnicas mais consagradas. Não demonstravam portanto a autoridade conquistada a duras penas pelos fotógrafos. Não raramente, a história da fotografia se pauta por essa mágoa e,
Leia Mais Mauricio Lissovsky | 30.abr.2012
Por quais caminhos uma nova “pequena história” da fotografia poderia nos levar – uma história que começasse a ser escrita de olho nas imagens que Walter Benjamin jamais viu? Quando o filósofo redigiu seu ensaio, em 1931, considerava que os primeiros cem anos da fotografia haviam sido marcados por um debate teórico, sob todos os aspectos, infrutífero, uma vez que comungavam os debatedores de um conceito de arte “alheio a qualquer consideração técnica”. Ao longo dos seus primeiros cem anos, e apesar de seu desenvolvimento acelerado, a fotografia havia persistido
Leia Mais Cláudia Linhares Sanz | 2.abr.2012
Na chamada da propaganda da Canon, quando Sofia é interrogada pelo locutor sobre qual o significado de ter refeito a fotografia, ela afirma ter sido a chance de recuperar o que deveria “ter dado certo na primeira vez e não deu”. Em seu depoimento, Sofia ‘reflete’: “Os grandes momentos escapam, e não temos oportunidade de reconhecê-los pelo que eles são. Quando se tem a oportunidade de observá-los, aí podemos olhar para trás e perceber que se tratava de um grande momento que não se tinha reconhecido”. As histórias apresentadas no
Leia Mais Mauricio Lissovsky | 19.mar.2012
É bem conhecida a história contada por Nadar que Balzac não gostava de posar com medo de ser “descamado” pela câmera. Mas esta não era a única fantasia que atormentava os modelos durante a lenta transmigração da aparência que caracterizava o ato fotográfico naqueles tempos. Havia também quem receasse ser sugado pela objetiva. Existem relatos, particularmente de mulheres, que declararam sentir seus olhos sendo atraídos para dentro da lente da câmera enquanto eram fotografadas. Acredito que boa parte do escândalo em torno de Fading Away (1858), de Henry Peach Robinson
Leia Mais Cláudia Linhares Sanz | 20.fev.2012
As fotografias nascem quando se tornam legíveis – e essa legibilidade diz respeito ao que se pode ver, pensar e acreditar em determinado ponto crítico de uma época. Como já mencionado, todo presente é determinado pelas imagens que lhe são sincrônicas. Cada agora é o agora de uma capacidade de perceber, tornar legível não o passado em si, mas a constelação entre a materialidade do agora atual e do agora virtual. A visibilidade de uma imagem – aquilo que se atualiza numa fotografia de modo imanente e singular – depende
Leia Mais Mauricio Lissovsky | 6.fev.2012
A história é bem conhecida. Em 1867, Dostoiévski visitava o museu da Basiléia, na Suiça, em companhia de sua mais recente esposa, Anna Snitkina, estenógrafa que havia colaborado com ele em “O Jogador”. Diante de uma pintura de Holbein, o Jovem, ele congelou, sem conseguir desviar os olhos. No rosto do escritor, a mesma expressão, mistura de êxtase e pânico, que costumava ter na iminência de um ataque epilético. No quadro do museu, Cristo, em tamanho natural, deitado em sua tumba.
Leia Mais Ronaldo Entler | 30.jan.2012
Nestas férias, li Diário de Luto, de Roland Barthes, editado recentemente em português, com tradução de Leyla Perrone-Moisés. É um conjunto de pequenas anotações iniciadas em outubro de 1977, um dia após o falecimento de sua mãe, e que se estendem até setembro de 1979, seis meses antes de sua própria morte. No meio disso, entre 15 de abril e 3 de junho de 1979, ele escreveu A câmara clara. Etienne Samain já havia observado que esse livro, que tem 48 capítulos, foi escrito em exatos 48 dias, possivelmente, também sob
Leia Mais Ronaldo Entler | 12.dez.2011
Eu procurava na internet informações sobre alguns textos, quando encontrei um blog – sem atualizações e provavelmente não oficial – de divulgação do livro de Arlindo Machado, “O sujeito na tela” (2007). Estranhei o retrato publicado ao lado de sua biografia. Mas a idade faz essas coisas: de um lado, enfraquece nossas lembranças e, de outro, muda a aparência das pessoas. Quase assimilei sua nova fisionomia. Depois, descobri que se tratava do crítico e cineasta alemão Alexander Kluge, que Machado conhece bem e sobre quem já escreveu. Além de alguma
Leia Mais Cláudia Linhares Sanz | 28.nov.2011
Às vezes uma fotografia nasce pela força de futuro, outras vezes pela insistência do presente: existo, existo, existo – resisto. Há, no entanto, fotografias que surgem porque o que já não existe persiste como fantasma, do mesmo modo que a estrela que, separada pelos milhões de anos luz – só encontra sua imagem quando já silenciada. A estrela sobrevive na imagem graças ao impulso de um passado que deseja viver no futuro e que pressiona em direção a ele. Ela, no entanto, só pode ser vista (e existir) por um
Leia Mais Mauricio Lissovsky | 14.nov.2011
Por meio do duplo a fotografia interroga-se sobre sua história e a respeito do papel que lhe cabe no mundo. Uma das formas recorrentes do duplo fotográfico é colocar em cena as relações entre a fotografia e outros modos de aparecer das imagens. Em 15/02/1937, a página 9 da revista Life estampou uma das fotos mais famosas de Margaret Bourke-White: diante de um outdoor onde a família branca sorridente viaja de férias em seu carro, uma fila de homens e mulheres negros, refugiados das enchentes em Louisville (naquele ano, as
Leia Mais Cláudia Linhares Sanz | 24.out.2011
Ano passado as cigarras cantaram durante semanas para anunciar a chuva. Sempre ouvi dizer que elas anunciavam dias ensolarados, mas aqui no cerrado não. Quando seu canto ensurdece a tarde é porque a seca está finalmente cedendo. Nos dias cantantes das cigarras, a seca parece ainda mais intensa e dura tanto quanto as dobras dos vestuários no início da fotografia de Walter Benjamin (quando vivíamos não ao sabor do instante, mas dentro dele, crescendo dentro da imagem).
Leia Mais Mauricio Lissovsky | 17.out.2011
Proust escreveu que a “imobilidade das coisas que nos cercam talvez lhes seja imposta por nossa certeza de que essas coisas são elas mesmas e não outras, pela imobilidade de nosso pensamento perante elas”. Vejam esta fotografia de Baudelaire, feita por seu amigo Nadar. Parece estática para nós, hoje em dia, mas há todo um movimento ali. Um movimento que o poeta procurou expressar em um soneto dedicado ao fotógrafo. Depois de comparar a experiência de posar no estúdio fotográfico a morrer de uma “dor saborosa”, “misto de êxtase e
Leia Mais Ronaldo Entler | 26.set.2011
A atividade do olhar é normalmente entendida como captação discreta e passiva dos movimentos do mundo. Mas o próprio olhar é movimento, como diz Alfredo Bosi, “com propriedades dinâmicas de energia e calor graças a seu enraizamento nos afetos e na vontade” (“Fenomenologia do Olhar”, 1988. p. 77). Alguns artistas buscam reconhecer os momentos em que o olhar revela sua espessura, em que se torna por si mesmo uma performance, gesto que afeta também aquilo que é visto. Quando o olhar se torna visível, seus vetores compõem um enredo: o
Leia Mais Mauricio Lissovsky | 13.set.2011
Há este carte de visite do Imperador do Brasil e seu duplo, feito por Carneiro & Gaspar, em 1867. Nele, Dom Pedro II, aficionado e colecionador tenaz de fotografias, apesar da sobriedade da expressão, empresta sua real figura a uma anedota. O grande interesse de Sua Majestade pela técnica fotográfica pode tê-lo motivado a submeter-se a este “experimento” (na mesma ocasião, também foi feita imagem similar da Imperatriz Teresa Cristina), mas é impossível deixar de associar esta imagem à tradição taumatúrgica do caráter duplo do corpo do Rei: um corpo
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