
Walker Evans, Signs, NY, 1928-30.
Walker Evans (1903, St. Louis, Missouri – 1975, New Haven, Connecticut) sem dúvida, uma referência na história da fotografia, está presente pela primeira vez em São Paulo, com uma exposição individual no MASP, que reúne 113 fotografias que abrangem diferentes períodos de sua trajetória profissional. A relação mais imediata que normalmente se faz com seu trabalho é que ele foi um dos fotógrafos ativos na década de 1930 no programa da Farm Security Administration (FSA). Mas sua grandeza e sua importância estão muito além disso. Evans é acima de tudo um intelectual refinado que se aproximou com muita intensidade da literatura e se conectou com movimentos artísticos que pontuam sua obra em diferentes momentos. Basta aprofundar um pouco nosso olhar sobre seu percurso para saber, por exemplo, que Evans incorporou o intelectualismo europeu da modernidade e das vanguardas, em particular o contexto literário que está presente e é significativo em sua fotografia. Ele mesmo se denominava “um homem da literatura, influenciado por Flaubert, Baudelaire, Proust, Stendhal, Henry James, Hemingway e acima de tudo James Joyce”.
Influenciado por Eugene Atget, entre outros, sempre rejeitou o rótulo de “fine art photographer”. Aliás, o trabalho de Walker Evans foi muito mais publicado em livros, catálogos e revistas, do que exibido em museus e galerias. Assumiu esse compromisso desde o início de sua carreira, optando por publicar suas imagens. Mesmo assim, tornou-se referência para muitos, entre eles Robert Frank, Lee Friedlander, Diane Arbus, Garry Winogrand, o melhor da fotografia americana produzida entre as décadas de 1950 e 1970. Robert Frank, por exemplo, se aproximou de Evans desde sua primeira viagem aos EUA, e o tornou seu mentor intelectual. Por sua vez, Evans além de considerá-lo um jovem talento, foi o responsável (e uma espécie de co-autor secreto) por estimulá-lo a escrever um projeto à Fundação Guggenheim, do qual era conselheiro. A realização deste projeto após dois anos e 767 rolos de filmes 35mm, concretizou-se em outro clássico, o livro Les Américains, com 83 fotografias, em 1958, editado por Robert Delpire.
Walker Evans por sua vez, já era consagrado quando Robert Frank chegou aos EUA pela primeira vez no final dos anos 1940. Foi colaborador da revista Fortune e em 1934 apresentou um vigoroso ensaio sobre o Partido Comunista dos EUA. Mais tarde tornou-se editor associado de fotografia e colaborou até abril de 1965. Entre outras realizações, em 1933, sua exposição Walker Evans: Photographs of 19th Century Houses, foi a primeira individual na história institucional do MOMA, apesar de Beaumont Newhall considerá-la apenas como uma exposição dedicada à arquitetura e não à fotografia. Mas, foi em 1938, com a lendária exposição American Photographs, resultado das fotografias produzidas nos dois anos anteriores no sul dos EUA, é que Walker Evans inscreve seu nome nas artes visuais. Praticamente criou um estilo para a fotografia americana e a mostra é considerada a primeira manifestação da fotografia como arte autônoma no MOMA.
Em 2008, tive a oportunidade de participar da banca de doutorado de Diana de Abreu Dobranszky, da Unicamp, que pesquisou durante mais de um ano os arquivos do MOMA para sua tese “A legitimização da Fotografia no Museu de Arte: o Museum of Modern Art de Nova York e os anos Newhall no Departamento de Fotografia”, orientada pelo Prof. Dr. Fernando de Tacca. Um exemplar está disponível na Biblioteca do Instituto de Artes da Unicamp e recomendamos fortemente este trabalho pela quantidade e qualidade dos dados reunidos e que discute e relaciona a presença da fotografia no MOMA, após árdua e intensa pesquisa.
O curioso é que a exposição American Photographs contempla mais de uma centena de fotografias produzidas ao longo de uma década e foi minuciosamente editada por Evans. A mostra foi concebida por Lincoln Kirstein, seu amigo de toda a vida, teve organização inicial de Newhall. Mas, este último foi praticamente hostilizado por Evans que optou pelo controle total da exposição, criando conscientemente, uma narrativa consistente que valorizava intenção, continuidade e clímax. Por outro lado, o livro publicado com o mesmo título tem projeto editorial do fotógrafo, mas é completamente diferente. 47 fotografias da exposição não estão no livro e 33 outras que estão editadas na publicação não estão na exposição, o que diferencia os dois produtos, ambos clássicos e referenciais.

Walker Evans: The Hungry Eye, de Gilles Mora e John T. Hill
Antes da FSA, Walker Evans já tinha realizado e publicados alguns ensaios contundentes e reveladores, entre eles, Brooklyn Bridge e New York Streets, ambos de 1929, Tahiti, de 1932 e Havana, de 1933. Segundo Gilles Mora e John T. Hill, no fascinante livro Walker Evans – The Hungry Eye, “entre os 75 mil negativos dos arquivos da FSA, Evans contribuiu com apenas algumas poucas centenas. Sua produção, realizada no período dezembro de 1935 e julho de 1938, é diferenciada e não obedeceu aos preceitos de Roy Stryker, um dos coordenadores e que alinhava as imagens à ideologia do projeto. Evans se recusou participar deste contexto e quando se afastou, deixou claro que sua fotografia para FSA “era puro registro, não propaganda”.
Walker Evans é um fotógrafo intenso, dramático e lógico, que soube articular com precisão a câmera para não transformá-la num mero aparato de reprodução, mas dotá-la de uma inteligência mediadora conectada ao seu olhar instigante e crítico. A exposição Walker Evans em exibição no Masp – Museu de Arte de São Paulo, Avenida Paulista, 1578 – tem encerramento previsto para o dia 10 de janeiro de 2010. Não deixe de ver.
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