Viver o novo e compartilhar emoções

[14.mar.2011]

Como sempre, a cidade de São Paulo oferece muitas opções para quem gosta e aprecia a fotografia. Seja diletante, artista, estudante, pesquisador, crítico de artes visuais, a oferta é sempre muito grande e diversificada nos espaços institucionalizados. Neste momento, a Pinacoteca do Estado, exibe Revolução na Fotografia, de Aleksander Rodtchenko; o Instituto Moreira Salles, Uma Antologia Pessoal, retrospectiva de Thomaz Farkas; a Caixa Cultural, Olhar-Imaginário, de German Lorca; o Instituto Tomie Ohtake, Relicário, de Vik Muniz; o Centro de Cultura Judaica, Marcados, de Cláudia Andujar (abertura prevista para dia 15 de março); o Museu AfroBrasil, Antífona, de Gal Oppido; o Sesc Belenzinho, Ituporanga, de Caio Reisewitz;  a Fauna Galeria, Mulheres dos Outros, de Eduardo Myulaert; o MIS, Blues, de Klaus Mitteldorf; entre outras mostras que merecem visitação.

German Lorca, imagem da exposição "Olhar Imaginário"

German Lorca, imagem da exposição "Olhar Imaginário"

Visitar estas exposições é sempre um saudável exercício de leitura visual, pois juntas elas oferecem uma visão panorâmica de qualidade incomum sobre a fotografia moderna e contemporânea. Digo isso porque, tanto no aspecto curatorial quanto na questão da expografia, são perceptíveis as diferenças em termos de abordagens e escolhas assumidas. Isso é, sem dúvida, muito enriquecedor para quem vê as exposições porque, além das informações adquiridas via a própria fotografia, você poderá compará-las no tempo e no espaço.

O que nos cabe indagar é porque a produção mais jovem, que sabemos que existe, dificilmente encontra espaços para exibição. Há poucos meses, tivemos a inauguração da Zipper Galeria, que se assume como o espaço para este tipo de produção, mas cuja primeira iniciativa, paradoxalmente, foi a exposição A casa em festa, de Flavia Junqueira, artista já bem conhecida do público paulistano. Além disso, na edição da Expo Arte Fotografia de 2009, seu trabalho teve expressiva comercialização através de outra galeria.

Sabemos o quanto é difícil manter um espaço para exibição, mas alijar do processo a produção jovem contemporânea é não querer apostar em alternativas que podem a médio prazo se transformar em soluções, inclusive econômicas. Participo como conselheiro de alguns dos mais importantes eventos de fotografia do país e sei o quanto é difícil assumir, mesmo que parcialmente, a exibição dessa nova fotografia brasileira. Geralmente, os principais entraves são o tempo para pesquisar e o compromisso com os patrocinadores, o que significa, em outras palavras, um retorno antecipado e garantido de mídia espontânea.

Quando escrevo nova fotografia brasileira tenho certeza que muitos compreenderão. Nos diferentes encontros realizados em diferentes centros de produção do país, temos acesso aos portfólios e ao jovem fotógrafo – ou seria image maker? Por isso mesmo, sinto que este é o momento de mostrar alguns trabalhos que são produzidos nas várias regiões brasileiras, particularmente aqueles que têm um frescor sintonizado com o contemporâneo. A fotografia numérica, ou digital se quiserem, trouxe novo aprendizado, diferente do convencional. Os jovens que vem investindo nessa produção de imagens mostram-se, mesmo desprovidos em parte de um passado muito técnico, histórico e estético, com coragem suficiente para apontar outros caminhos dentro de uma nova e possível sintaxe fotográfica.

Breno Rotatori, série Bloco de Notas

Breno Rotatori, série Bloco de Notas

É interessante percebermos nessas imagens a singularidade das cores que emergem da tecnologia digital. Cores que não vemos, mas que a câmera registra. Não só isso: temos ainda as texturas diferenciadas, as formas ruidosas, o excesso das luzes que pulsam distintamente e o tratamento da imagem nos ambientes de baixa luminosidade. Esse distanciamento dos procedimentos da fotografia convencional e essa intimidade com os novos ambientes tecnológicos e perceptivos se insinuam como alternativas estéticas. Talvez como outros paradigmas visuais.

Já se falou demais sobre a relação entre a fotografia analógica (de base química) e a fotografia numérica (de base digital), mas ainda não sabemos avaliar sua real contribuição neste exato momento tecnológico. Seguramente, a idéia de produção e criação de imagem a partir da perspectiva artificialis está em crise. Não é somente a crise dos suportes ou a crise de gerações. É um novo olhar que se instaura e que procura seu espaço na atual produção das artes visuais.

Diante desse abismo inexorável em que nos encontramos e cujo poder de ruptura desconhecemos quase completamente, cabe nos perguntar quanto tempo ainda será necessário para que o circuito institucionalizado, incluindo aí o mercado, arrisque mais e comece a exibir e refletir sobre a novíssima produção fotográfica contemporânea. Que tal pensarmos mais seriamente em viver em profundidade essa produção visual e (re)aprender a compartilhar emoções?

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Jornalista, curador e crítico de fotografia, doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, professor e diretor da Faculdade de Comunicação da Fundação Armando Alvares Penteado (Facom-FAAP).

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