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PESQUISA EM ARTE:
ACASOS E PERMANÊNCIAS ENTRE INVERSÕES DE UM PROCESSO GRÁFICO

Lurdi Blauth, 2007

 

Ao iniciarmos uma pesquisa em arte nos questionamos sobre qual o ponto de partida e como se poderia realmente efetivar uma investigação numa área em que as questões surgem durante o processo da produção artística. Para Lancri1, “o ponto de partida da pesquisa em arte situa-se, obrigatóriamente na prática plástica, com o questionamento que ela contém e as problemáticas que ela suscita. A parte da prática plástica, sempre pessoal, deve ter a mesma importância da parte escrita, não simplesmente justaposta, mas rigorosamente articulada”.

Essas constatações levam-me a tecer indagações sobre as questões conceituais presentes na minha produção plástica, investigando o fazer poïético e as inter-relações com as reflexões teóricas. Assim, a metodologia proposta constituiu-se pela produção de uma série de obras, cujos conceitos operatórios foram detectados durante o processo de criação plástica e articulados com referenciais artísticos, bem como, em outros campos de conhecimento, propiciando o inter-relacionamento da prática com a teoria e vice-versa. Contudo, nesse artigo analiso apenas alguns aspectos que serviram de referência inicial, anotando aproximações e desvios que perpassaram durante a investigação. Desse modo, segundo Lancri2,

É necessário organizar conceitos puramente táticos e que estes possam antecipar o objeto da pesquisa, isto é, a trajetória do futuro trajeto, através de conceitos heurísticos, os quais deverão preparar a descoberta da diferença entre o projeto e o trajeto. Ao mesmo tempo, também será preciso distanciar-se dos conceitos quando vir o momento decisivo do despojamento e da rejeição do projeto e, ao termo da pesquisa, substituir por outros mais descritivos ou explicativos, invalidando os que eram destinados a serem operacionais somente no início da pesquisa.

Os meus questionamentos, portanto, são provenientes da minha prática investigativa com a gravura e o diálogo com o próprio gesto de gravar que produz esvaziamentos na matriz, redimensionando as múltiplas possibilidades de registrar e resignificar as inversões gráficas entre vazios e cheios, entre presenças ausências. Os conceitos operatórios de cortar, queimar e imprimir são atos instauradores no processo de criação, com os quais exploro meios de gravar através do controle e do acaso, utilizando procedimentos de impressão que registram os intervalos dessas ações-subtrações.

A utilização de instrumentos (goivas) para fazer incisões em determinadas áreas na matriz, propiciam um certo controle do gesto, direcionando o corte e, com o fogo acontece o inverso, pois o gesto é substituído pela ação não controlada. Ao mesmo tempo em que alguns princípios de vazio e cheio, inerentes aos meios de gravação e impressão encontram-se imbricados nas imagens, percebo que as aproximações pelo contato entre as diferentes matérias e materialidades remetem a outros procedimentos operatórios durante o processo de criação. E, na medida em que ocorre o desdobramento desse fazer prático, de acordo com Rey3 “nos deparamos com imprevistos e acasos, acontecimentos esses que acabam abrindo flancos em nossas certezas e induzem-nos a redirecionar caminhos pré-estabelecidos”.

Poderíamos indagar como se forma a imagem nesse processo? De acordo com Pareyson4, “o procedimento da arte é um puro tentar: um tentar que não se apóia senão em si mesmo e no resultado que se espera obter”. No meu processo de criação, ocorrem momentos que envolvem experimentações e testagens a partir de determinadas escolhas de materiais que são colocados em confronto e, nesse percurso entre decisões e indecisões, entre erros e acertos, a imagem se concretiza. Todavia, nesse movimento observam-se coisas que são indizíveis, mas que estão ali evocando algo do invisível, aquilo que o pensamento não tem controle e entram em acordo durante o processo do fazer e do pensar.   É como assinala Valery5: “na produção da obra, a ação vem sob a influência do indefinível”. 

Percebemos que no processo de produção da obra se estabelece uma espécie de um “regime de execução durante o qual há uma troca entre as exigências, ou conhecimentos, as intenções, os meios, todo o mental e o instrumental, todos os elementos de ação”6, os quais não tendo uma determinação precisa anterior, não propiciam, conseqüentemente, uma previsão segura daquilo que irá resultar, porém, aproximações entre as possibilidades matéricas dos materiais que são colocados em conexão.

Por outro lado, Pareyson7 menciona que “na maioria dos casos as matérias chegam ao artista marcadas por uma longa tradição de manipulação artística e, por isso mesmo, tão exigentes, a ponto de parecerem impor-se por si mesmas às intenções formativas e arrastá-las na própria direção”.  O autor afirma que muitas vezes essa tradição de alguns instrumentos da arte como, por exemplo, o pincel e o buril, ou mesmo os instrumentos musicais são determinantes na produção da obra, assim como a própria escolha são definidores da intenção artística.  

Num primeiro momento, estas questões poderiam ser um tanto paradoxais, como se a obra fosse apenas resultado do material ou apesar dele. Porém, quando adotamos determinados meios e materiais, nos defrontamos com a matéria e os seus princípios intrínsecos, assim como os questionamentos da sua própria linguagem que irão repercutir na sua visualidade. Na gravura, é necessário compreender as operações dos meios que envolvem a ação gráfica para que as estruturas mentais e materiais entrem em sintonia com as outras possibilidades, muitas vezes inesperadas, ampliando e invertendo procedimentos considerados permanentes. Nesse aspecto entendemos que os procedimentos não podem ser reduzidos ao produto final, porém, é ser no processo e, inevitavelmente provocam-se alterações durante o percurso. É como afirma Bachelard8,

A gravura, mais do que qualquer outro poema remete-nos ao processo de criação. O mistério da luta entre mão e matéria, acompanha essa vontade do gravador em “ir ao minúsculo das coisas”, provocando “à competição da matéria negra e da matéria branca”, entre o sim e o não, entre a luz e a cor.

A gravura, mais do que qualquer outro poema remete-nos ao processo de criação. O mistério da luta entre mão e matéria, acompanha essa vontade do gravador em “ir ao minúsculo das coisas”, provocando “à competição da matéria negra e da matéria branca”, entre o sim e o não, entre a luz e a cor.

Nesse aspecto, entendemos que a elaboração da obra encontra-se vinculada às delimitações e às potencialidades inerentes das matérias utilizadas e, através dela empregamos, como assinala Ostrower, certas possibilidades de ação e tantas outras impossibilidades. Há uma confluência de ações que intervêm durante o processo de construção da obra, nas quais selecionamos algumas alternativas e excluímos outras, e nesse contexto, no formar, todo o construir é um destruir9. Entre o processo criativo e a escolha dos procedimentos, o que incita a minha criação artística é justamente a referência que possuo dos meios e dos materiais escolhidos pelas suas possibilidades gráficas. Simultaneamente, as matérias não são destituídas de suas potencialidades intrínsecas, ao contrário, são exploradas e manipuladas no intuito de tensioná-las e modificá-las, atribuindo-lhes novas significações. A respeito disso Salles10 coloca,

O processo criativo é palco de uma relação densa entre o artista e os meios por ele selecionados, que envolve resistência, flexibilidade e domínio. Isso significa uma troca recíproca de influências. Esse diálogo entre artista e matéria exige uma negociação que assume a forma de obediência criadora. 

No percurso criativo, portanto, ocorrem acasos e imprevistos e, muitas vezes provocam desvios que podem ser absorvidos na obra pelo artista. Ou ao contrário, quando as experiências realizadas não alcançam determinados resultados, são descartados. As diversas tentativas entre diferentes caminhos envolvem um processo de fazer e refazer, porém, quando o objetivo é alcançado, sabemos que o encontramos. Para Duchamp11,

O artista, passa da intenção à realização através de uma cadeia de reações totalmente subjetivas. Sua luta pela realização é uma série de esforços, sofrimentos, satisfações, recusas, decisões que também não podem e não devem ser totalmente conscientes, pelo menos no plano estético. O resultado desse conflito é uma diferença entre a intenção e a sua realização, uma diferença de que o artista não tem consciência.

O pensamento de Duchamp enfatiza essa necessidade do artista permitir-se de um certo esquecimento de um saber muito preciso em relação aos meios, e, para que flua a criação, é fundamental deixar uma certa margem para o acaso.

A intervenção do acaso na arte começa a ser preconizada a partir das experiências dos dadaístas, os quais começaram a incorporá-lo como um novo elemento de estímulo no processo de criação artística. Os acidentes, as surpresas ou coisas imprevistas, que intervêm no ato criador, tornaram-se um meio deliberado e inesgotável para novas expressões. A atribuição intuitiva de um sentido ao fato que acontece por acaso que muitas vezes a imaginação criadora se revela e se configura em novas possibilidades.

No procedimento de gravação com fogo provoco, gradativamente, a destruição das matrizes, nas quais surgem fragmentos dispersos dessa interferência não controlada. E, é dessa ação de queimar que surgem os acasos na produção dos trabalhos da série Sílex.  Nesse processo, os acasos e os acidentes são incorporados como imagem, não como algo aleatório e vago, mas ativados pela combustão, isto é, pela ação do fogo que ocasiona esvaziamentos e transformações na matriz. Assim, o meu processo de criação artística se articula a partir de uma dimensão heurística, propiciando a abertura para possíveis desvios, para que sejam redimensionados e incorporados ao trabalho, como nos aponta de Didi-Huberman12,

O procedimento supõe a operação como um conjunto de propriedades estruturais, ela sublinha a dimensão teórica e mesmo lógica dos procedimentos, dos processos, das escolhas formais. Ela coloca no trabalho artístico essa dimensão que qualifiquei de heurística, onde as manipulações materiais e processuais aparecem como tantas hipóteses, o que a definição epistemológica de heurística designa na expressão working hypothesis.

Desse modo, entendemos que a produção das imagens não é casual, surge do envolvimento no seu processo constitutivo, no conhecimento pessoal dos meios e das possibilidades intrínsecas dos limites e da natureza das matérias que se desorganizam e organizam durante o trajeto. Nos meus trabalhos, os procedimentos não correspondem apenas à transferência de elementos vazios e cheios gravados sobre uma matriz, mas ao contrário, é nesse trânsito entre indeterminações e certezas que acontece o processo de criação e, conseqüentemente a transformação. Derdick13 assinala:

O fazer criador provoca contornos que se contaminam, absorvendo os acasos e as necessidades, dissolvendo os vácuos entre o que se projeta  e não acontece e que não se projeta e acontece, fazendo de si uma ação em estado de gerúndio: híbrida, espessa, irresoluta, inacabada.

Portanto, o processo criador envolve seleções, apropriações e experimentações com diversas possibilidades de combinações e transformações entre semelhanças e diferenças da matéria e conseqüentemente ocorre a intervenção do acaso e do imprevisto. No meu processo de criação a imagem é ativada entre a perda e o contato, entre a ausência e a presença, entre os vazios e os cheios e, na série Sílex, a matriz não é um negativo, configura-se no processo como forma e imagem.

Nas imagens da série Sílex encontram-se imbricados as diversas peculiaridades da madeira e da parafina, nas suas diferenças entre o rígido e o fluido, entre o denso e o translúcido, assim como o gesto incisivo e a ação de acender o fogo, estão interagindo e provocando diferentes reações durante a criação da imagem. Ocasionam-se desvios no percurso, pois a madeira e a parafina não são matérias passivas, mas orgânicas, com diferentes resistências que são inerentes às suas materialidades, assim como o gesto, vem imbuído de pulsões e intensidades.

Todavia, é interessante perceber como as experimentações são articuladas por outros artistas que trabalham com a gravura, justamente para entender que os meios técnicos não estão restritos a um procedimento convencional, porém, encontram-se vinculados com diferentes questões gráficas. Citamos o exemplo de Arthur Luiz Piza (São Paulo, 1928)14, que nos relevos e gravuras, busca em cada composição algo novo e inusitado e, como ele mesmo afirma quando se põe a trabalhar, que nunca parte de um desenho preparatório, no máximo tem uma vaga idéia do contorno. Ou como, nas intermediações operadas por cortes e incisões na obra de Ernesto Bonato (São Paulo, 1968), através das quais o artista busca a materialização de uma realidade que está submersa, ou seja, algo que imagina encontrar no interior da forma. Para este artista, com o procedimento de gravar, pretende entranhar o desenho na madeira, uma matéria dura e rígida, ao mesmo tempo em que tenta materializar, através das imagens, algo que está além da realidade externa. A partir de gestos incisivos, o artista interage profundamente na matéria para então constituir a unidade da imagem.

Por outro lado, o procedimento de incorporar um constante devir, ao contrário do que se poderia supor, nem sempre é fácil ou não faz parte das intenções do artista. A artista Lygia Pape (Nova Friburgo, RJ, 1929), que utiliza as possibilidades objetivas da xilogravura, num depoimento, em 1975, à Frederico Morais coloca: “sempre me horrorizou, na gravura em metal, a idéia de que o ácido trabalha por você, como uma espécie de co-autor. O que me atraía fundamentalmente na madeira eram os seus poros”.15 A escolha da xilogravura para trabalhar, é para ter um maior controle sobre o material, diz ela:

O que me deslumbra é o poro impresso, o branco cavado na chapa, a impressão final, apesar de sempre desenhar antes de gravar [...] da seleção da madeira do poro mais ou menos aberto [...] de um negro mais ou menos intenso, da espessura dos cortes, das linhas, do próprio papel. Sobre a idéia do acaso afirma que acaso não existe na gravura que realizo. Toda ela é controlada: desde a escolha do material, qualidade da madeira à impressão final.

Ao mesmo tempo, em que a artista tem um certo controle sobre o seu processo de trabalho, Pape nas gravuras da série Tecelares, aponta para outras possibilidades e transformações do meio gravado, indo além dos limites impostos pela matéria rígida.  Ao contrário de Pape, os cobres gravados de Iberê Camargo, refletem uma gestualidade e uma carga pulsional pela sua interação química e corrosiva do ácido para conduzir a matéria e dela extrair o signo gráfico. 

Já no processo de criação de Soulages16, por exemplo, observamos que o acaso é incorporado na sua obra através do confronto entre as matrizes de cobre e a ação do ácido, provocando transformações pela destruição da matéria. Embora o controle da gravação das matrizes de cobre com ácido seja relativo, o artista menciona que esse procedimento é um acaso aceitável (hasard accepté). Isso quer dizer que ele tem plena consciência sobre os imprevistos que ocorrem durante a criação do trabalho, ao mesmo tempo em que exerce um certo controle sobre o procedimento técnico que utiliza. Contudo, quando a gravação é feita com um instrumento ocorre um maior controle, já que é a vontade de alguém impondo uma linha de uma forma mais rígida e determinada; ao contrário do ácido, há menos controle, obtendo-se pela ação corrosiva, a transformação mais orgânica da matéria, buscando aspectos relacionados ao tempo, a durabilidade e a destruição.

Nas imagens gravadas de Soulages fica evidenciado que a gravura não é um trabalho de superfície, é resultante do envolvimento das corrosões, dos cortes e das perfurações. As perfurações (buracos) das placas remetem à ausência de impressão, e, nesse movimento tudo sobe e desce, como ele mesmo sublinha, tout a basculé. As matrizes de cobre são corroídas em algumas áreas até transpassar a sua superfície no intuito de buscar o espaço vazio no branco do papel e, em outras, a própria matriz é o objeto/obra gravada. Contudo, as matrizes que são impressas sobre o papel criam uma certa tensão entre os espaços brancos retidos pela imagem e as margens do papel, as quais geralmente aparecem somente como um contorno da imagem. Todo o espaço branco do papel entra em conexão, ou seja, o branco do papel dá-se a ver, e a gravura se faz centro: “centro forte, presente e que faz a folha inteira reagir, obrigando o vazio a se materializar, o branco tornar-se luz”17 e, o papel não é um simples suporte, mas parte integrante. E, “ali onde tem os buracos gravados nas placas de cobre, o papel na sua matéria vive sua vida de papel, transforma-se em contraste”.18

Nos meus trabalhosda série Sílex, mesmo utilizando meios e materiais diferentes, também ocorre um certo acaso aceitável, quando as matrizes de madeira são queimadas sobre a parafina. As diferentes resistências da madeira e da parafina entram em combustão através do calor do fogo, proporcionando uma intervenção mais imediata de transformação. E o que poderia ser considerado apenas o suporte sobre o qual a imagem gravada da matriz se revela, ocorre a fusão entre matriz e imagem. Nesses trabalhos, a queima opera a transformação interna da matéria, ao contrário dos gestos incisivos que produzem marcas negativas sobre a matriz, para depois serem transferidas para o suporte. O fogo produz a negação da matéria pela carbonização e desestruturação da matriz e, no instante em que ocorre o contato com a parafina, restos de vestígios carbonizados são retidos e condensados na sua matéria.


Sílex III -  72 módulos de parafina (14 x 14 x 4 cm cada),  336 cm, 2002.

Sílex IV - Matriz sobre módulo de parafina em processo de queima, 2002.

Ao mesmo tempo, a introdução da parafina como suporte das matrizes carbonizadas, provoca uma certa reversibilidade em relação aos meios utilizados anteriormente. Percebo que a parafina não é uma matéria passiva - muda de estado com o calor -, e, sendo um suporte ativo pelas possibilidades intrínsecas à sua materialidade, propicia entrar na sua matéria, pois ela se desinforma e se condensa durante o processo.  Não quero afirmar, no entanto, que os suportes utilizados anteriormente, como os papéis opacos e os translúcidos sejam passivos, assim como já observamos na obra gráfica de Soulages, o suporte, o papel branco e vazio, interage para se constituir como imagem. 

A parafina, no estado líquido, penetra nos espaços intervalares entre os vestígios dos fragmentos e das fagulhas das matrizes desintegradas. No momento em que ela se solidifica, cristaliza-se a formação da imagem. Nesse aspecto, os códigos da natureza gráfica de matriz e de impressão, de positivo e de negativo invertem-se através desse contato. Poderíamos dizer que a matriz e o suporte se entrelaçam e se integram simultaneamente, originando uma outra possibilidade de formação da imagem. Portanto, nos trabalhos da série Sílex, o suporte se transforma, interagindo como imagem e, de uma certa maneira, esse procedimento opõe-se ao pensamento original da gravura, no qual se considera o suporte apenas como um fundo neutro, sobre o qual se imprimia a imagem gravada na matriz, que também perdia a sua função depois de concluída a tiragem.

Desse modo, esses trabalhos explicitam as diversas etapas que envolvem o tempo da gravura. Os intervalos e as passagens são evidenciados simultaneamente entre a metamorfose da matriz (em processo de queima) e da parafina (em processo de líquido/sólido), bem como nas sutis diferenças entre concentração e dispersão das partículas presentes nas matrizes carbonizadas. E, nessa transposição quase invisível entre os intervalos mínimos de tempo, revertem-se as oposições de vazio e de cheio em suas relações de ação positiva e de ação negativa. 

Embora, os meios originais de gravação e impressão estejam esgarçados, é justamente essa natureza gráfica que é explicitada nos meus trabalhos. O que incita a minha criação artística são as possibilidades gráficas dos materiais, nas suas peculiaridades de produzir marcas, memória, registros, vestígios, ou seja, permanecendo esta origem gráfica de matriz e imagem. Poderia dizer que, ao longo do meu percurso criativo com a gravura, mesmo utilizando procedimentos que exigem uma certa operação técnica, o inesperado e o acaso sempre foram incorporados nas imagens.

 


Notas:

1. LANCRI, J.  Colóquio sobre a Metodologia da Pesquisa em Artes Plásticas na Universidade. In: BRITES, B. TESSLER, E. O meio como ponto zero. Porto Alegre: UFRGS, 2002. P. 19. [voltar]  

2. Idem. P.27. [voltar]  

3. REY, S. Instauração da imagem como dispositivo de ver através. In: Porto Arte v. 13, nº21, maio de 2004. Porto alegre: Instituto de Artes, UFRGS, 2004. P.35. [voltar]  

4. PAREYSON, L. Estética – Teoria da formatividade. Rio de Janeiro: Vozes, 1993. P.69. [voltar]  

5. VALERY, P. Variedades. São Paulo: Iluminuras, 1999. P. 191. [voltar]  

6. Idem. P.191. [voltar]  

7. PAREYSON, L. Estética – Teoria da formatividade. Petrópolis: Vozes, 1993. P. 55. [voltar]  

8. BACHELARD, G. O direito de sonhar. São Paulo: Difel, 1986. P.53. [voltar]  

9. OSTROWER, F. Criatividade e processos de criação. Petrópolis: Vozes, 1978. p.32. [voltar]  

10. SALLES, C. A. Gesto inacabado – processo de criação artística. São Paulo: FAPESP: Annablume, 1998. P. 72. [voltar]  

11. DUCHAMP, M. O ato criador. In: BATTOCOCK, G. A nova arte. 2ª. Ed. São Paulo: Perspectiva, 1986. P. 73. [voltar]  

12. DIDI-HUBERMAN. L’empreinte. Paris: Centre Georges Pompidou, 1997. P.91. [voltar]  

13. DERDICK, E. Linha de horizonte – por uma poética do ato criador. São Paulo: Escuta, 2001.  P.28. [voltar]  

14. GRAVURA – Arte brasileira do século XX. São Paulo: Cosac & Naify/Itaú Cultural, 200. P. 122. [voltar]  

15. GRAVURA – Arte brasileira do século XX. São Paulo: Cosac & Naify/Itaú Cultural, 2000. P.128. [voltar]  

16. SOULAGES. L’ouevre imprimé. Paris: Bibliothèque nationale de France, 2003. P.31. [voltar]  

17. Idem. P.39. [voltar]  

18. Idem. P.54. [voltar]  

 

 

 

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